respirar o mesmo ar

A nossa única única importância é que podemos calarmo-nos. Escutar. Fazer disso fala. Embora, dizes e tens mais uma vez razão, é terrível escutar o mundo. O que fazer perante todas estas mortes civis? Vamos manter o sorriso, a esperança nos amanhãs quando a besta é esta alarvidade que ri no espelho que me acorda? Não há como fugir a esta evidência, meus caros amigos. Aquelas bestas que mataram nestas terríveis caçadas dos tempos modernos (chamas a isto moderno, imbecil?) éramos nós, não há como negá-lo. Eram por nossa causa, era para manter a circulação nas artérias e nas vias respiratórias das nossas cidades que eles mataram. Sim, podia ser de outra maneira, de outro modo, d'une autre façon d'être. Mas não foi. Agora só há um caminho. Ou paramos nós antecipadamente as nossas cidades ou seremos tão odientos, tão pouco civis que a nossa sobrevivência se tornará naquilo que estamos a fazer no Médio Oriente: uma questão de retórica.
Joaquim Paulo Nogueira, in Respirar o mesmo Ar, 20/05/2004


Não me esqueço daquele último texto no DJ Jovem; demorei anos a compreendê-lo completamente. Às vezes (demasiadas vezes) a única arma que nos resta é o direito de nos calarmos. É o último poder dos que estão condenados. E é preciso exercê-lo. Mesmo assim.

Sem comentários:

Arquivo